Com Parceria Transpacífico, Brasil fica ainda mais isolado comercialmente, afirma presidente da AEB

Embora não seja um dos 12 países que irão integrar a Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), o histórico acordo comercial assinado nesta segunda-feira terá impactos diretos sobre a abrangência do comércio exterior brasileiro. Com as facilitações, que prometem movimentar 40% da economia mundial, produtos brasileiros poderão ser preteridos em relação a itens de membros do pacto, graças à isenção de tarifas. “Após o anúncio de hoje, o Brasil fica ainda mais isolado comercialmente. Nós estamos vendo a festa acontecer, mas não estamos participando dela”, lamenta o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.

Em entrevista ao JB, o executivo afirmou que as exportações brasileiras, tanto de commodities quanto de manufaturas, estão ameaçadas. No caso das commodities, José Augusto vê reflexos menos preocupantes. Ainda que os membros da Parceria Transpacífico possam dar preferência a produtos vindos dos Estados Unidos, ele acredita que o Brasil já tem uma participação consolidada no mercado internacional. O setor de manufaturados, por sua vez, deverá sofrer impactos mais significativos.

De acordo com o presidente da AEB, as commodities respondem por 45% das exportações brasileiras para os EUA, enquanto os 55% restantes advêm de manufaturas, principalmente calçados, autopeças e materiais de construção. No lado das commodities, a venda de açúcar é uma das maiores preocupações. Segundo informações de agências de notícias, a Austrália receberá uma cota adicional de 65 mil toneladas anuais para exportar o produto para os EUA. “Se elevar a cota da Austrália, significa que vai diminuir a cota de alguém e esse alguém pode ser o Brasil”, alerta. Para os outros itens exportados para a potência – dentre eles semimanufaturados de ferro e aço, celulose, petróleo e ouro – José Augusto não vê, neste momento, concorrentes de peso que tenham assinado o acordo.

A desvalorização do real é um ponto positivo para a manutenção da atratividade dos artigos vindos do Brasil, mas o baixo market share e os altos custos de produção do país pesam contra sua competitividade. “Neste momento nós temos uma taxa de câmbio interessante, o que poderia tornar nosso produto mais competitivo sob o aspecto preço, mas não temos presença no mercado das manufaturas. Isso significa que não conseguimos transformar em exportação essa melhoria de preços”, ressaltou José Augusto. De acordo com ele, se descontado o aspecto cambial, os produtos brasileiros não são internacionalmente competitivos em função de seus altos custos de produção.

Na visão do presidente da AEB, as negociações da Parceria Transpacífico, que ainda precisam ser validadas pelos poderes legislativos dos países participantes, chamam atenção para dois aspectos da política de comércio exterior brasileira: o engessamento das negociações comerciais acarretado pelo Mercosul e o descaso com as exportações de manufaturas. “O Mercosul é uma camisa de força que criamos e estamos presos a ela. Nos últimos sete anos, nós acompanhamos as exportações de produtos manufaturados caírem, mas nenhuma medida foi tomada. Espero que, com o anúncio de hoje, o Brasil acorde e comece a tomar decisões. Não podemos ficar deitados eternamente em berço esplêndido”, enfatizou.

Para José Augusto, a área de manufaturas foi esquecida pelo governo brasileiro, que priorizou um mercado de commodities que até então estava em alta. “Agora, com a queda nos preços desses produtos, não estamos preparados para exportar manufaturados. E essa é a razão das exportações terem uma queda fortíssima em 2015”, afirmou. Embora a balança comercial apresente recordes de superávit nos últimos meses, os resultados são reflexo da queda nas importações, e não do aumento das vendas ao exterior. Em setembro, o superávit chegou a US$ 2,944 bilhões, maior valor desde 2011. As exportações somaram US$ 16,148 bilhões, enquanto as importações caíram para US$ 13,204 bilhões. Para 2015, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) revisou suas projeções e agora espera um resultado positivo de US$ 15 bilhões.

A lentidão do Mercosul em realizar acordos comerciais que beneficiem seus membros também contribui para o isolamento comercial do Brasil. “Esse bloco simplesmente não sai do lugar. O Mercosul tenta negociar um acordo com a União Europeia desde 2003. Já são 12 anos e ainda não temos avanços. No mês que vem, as duas partes irão apresentar uma carta com propostas que ainda deverão ser avaliadas e rediscutidas”, criticou. O processo, de acordo com José Augusto, pode levar anos. Ele citou como exemplo o Acordo de Comércio Preferencial Mercosul-SACU, que embora tenha sido assinado em 2008, só agora foi aprovado pelo Congresso brasileiro.

Fonte: Jornal do Brasil