Santos: tamanho do porto não assusta fiscais da Anvisa
Peculiaridades e dimensões de armazéns, navios e terminais exigem arrojo dos servidores da Vigilância Sanitária federal em ação no maior complexo portuário da América Latina.
Os números do Porto de Santos são tão grandes quanto sua importância para o Brasil. Mais e maior são advérbios e adjetivos facilmente aplicáveis ao conglomerado de guindastes, galpões, tanques, dutos e pátios de paralelepípedo que se estendem ao longo das duas margens do estuário, nos municípios de Santos, Guarujá e Cubatão.
Inaugurado ainda no século XIX (1892), o maior complexo portuário da América Latina movimenta 130 milhões de toneladas, 3,8 milhões de contêineres e US$ 103 bilhões em valor de carga por ano. Faz circular 25% da balança comercial brasileira, sendo o porto que mais exporta açúcar, suco e café em grãos do mundo. Outras cargas de importância: soja, milho, trigo, sal, papel, automóveis e álcool. Possui terminais de carga para diversos produtos, entre granéis sólidos, líquidos e carga em geral. Também abriga um importante píer para passageiros. São nada menos que 15 km de cais e 65 berços de atracação.
Tão importante para o Brasil quanto o gigantesco complexo é o trabalho realizado pelos servidores do Posto da Anvisa de Santos. Os 14 fiscais do posto (quatro fazem anuência de importação em regime de teletrabalho), sob a chefia da especialista Erica Carvalho, dividem-se em diversas tarefas a fim de manter a segurança sanitária de produtos e pessoas em circulação e dos ambientes da estrutura portuária.
Inspeções e certificados – Cinco deles fazem a fiscalização das embarcações que atracam nas margens estuarinas de Santos, Guarujá e Cubatão. O objetivo das inspeções é a emissão do Certificado de Controle Sanitário de Bordo (CCSB) — ou, quando for o caso, a emissão do Certificado de Isenção e do Certificado de Livre Prática. Ambos estão previstos pela Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 72 da Anvisa.
O CCSB é um documento referenciado no Regulamento Sanitário Internacional. É entregue a uma embarcação quando evidências de risco à saúde pública foram detectadas durante uma inspeção de bordo, após a imediata e satisfatória adoção de medidas de controle pelos responsáveis. Já o Certificado de Isenção é concedido a embarcações que estejam livres de evidências de risco à saúde pública durante as inspeções.
O Certificado de Livre Prática é a permissão emitida pela Anvisa para uma embarcação operar embarque e desembarque de viajantes, cargas ou suprimentos, igualmente prevista no Regulamento Sanitário Internacional. É um documento entregue mediante análise das condições operacionais e higiênico-sanitárias da embarcação e do estado de saúde de seus viajantes, a partir de análise documental das informações apresentadas quando de sua solicitação e/ou de inspeção sanitária a bordo. As inspeções são realizadas por demanda dos responsáveis pelas embarcações. Sem os certificados, a viagem não prossegue.
Quatro servidores são responsáveis pela inspeção das cargas desembarcadas. O trabalho também é realizado segundo demanda dos importadores, quando as cargas estão sujeitas à vigilância sanitária, como no caso de alimentos, medicamentos, saneantes, cosméticos e produtos para a saúde.
Eles realizam ainda a chamada inspeção de infraestrutura, verificando nos terminais de cargas e passageiros itens como climatização, ocorrência de vetores, manejo de resíduos, limpeza e desinfecção, manejo de fluidos, condições de cantinas e lanchonetes e qualidade da água para consumo.
Um dos servidores do Porto de Santos é responsável pela emissão de Autorização de Funcionamento de Empresa (AFE) àquelas empresas que armazenam mercadorias sob fiscalização da Vigilância Sanitária e aos prestadores de serviço de coleta de resíduos e limpeza em porões de navios, em cumprimento às RDCs 345 e 346 da Anvisa. Este servidor também emite pareceres sobre mercadorias abandonadas, por demanda da Receita Federal, pois o órgão só faz a doação de alimentos e outros produtos porventura abandonados no porto depois de a Agência se pronunciar sobre a sua qualidade. Por fim, existe ainda o acompanhamento de incineração de drogas apreendidas pela Receita em operações no complexo.
Três servidores fazem serviços administrativos e três são motoristas.
Três momentos da inspeção – Na manhã chuvosa e ventosa de 13 de agosto, o fiscal do Posto da Anvisa de Santos Rodrigo Balbuena Machado preparava-se para mais um dia na rotina de fiscalização do maior porto da América Latina. Ele consultava sites para se inteirar da movimentação de embarcações no complexo portuário. Naquele dia, 91 navios aguardavam na barra de Santos para atracar, embarcar ou desembarcar vários tipos de cargas. Dentro em pouco, Rodrigo sairia do posto, localizado no bairro Aparecida, para se dirigir ao cais conhecido como Alamoa. Atracado no local, o navio Stolt Spray, de bandeira caimanesa, um monstro de 162 metros de comprimento capaz de deslocar 14 mil litros de água quando em deslocamento, aguardava pela inspeção de bordo da Anvisa.
Ao final de três horas de inspeção, depois de analisar documentos e circular por diversos compartimentos do navio, o fiscal encerra o detalhado trabalho, desejando “Good travel” ao sisudo comandante russo do navio. O Stolt Spray levava uma carga tóxica de ácido acético para o Porto de Paranaguá, no Paraná. Ele seguiria viagem chancelado pelo Certificado de Controle Sanitário de Bordo fornecido pela Anvisa.
No dia seguinte, acompanhado pelo colega Carlos César Russo, Rodrigo parte para inspecionar a área externa da maior instalação portuária especializada no embarque de açúcar no mundo. É o terminal da Rumo Logística, cujos armazéns estocam açúcar a granel e ensacado, além de outros granéis sólidos. A tarefa ali é averiguar a limpeza dos pátios. Poças d´água, restos de granéis, focos de vetores e resíduos de qualquer ordem são indesejáveis do ponto de vista sanitário. É uma inspeção visual a que os dois servidores se dedicam nesta manhã. Eles observam e são observados. A simples presença da fiscalização da Anvisa no pátio provoca intensa movimentação entre os funcionários da empresa, repentinamente atentos a pequenos detalhes da faxina no local.
Na tarde do mesmo dia, são os fiscais Valdir Sanchez e Camila Rediguieri que irão tomar uma balsa para seguir em direção a um terminal localizado no Guarujá, na margem esquerda do porto. Objetivo: verificar a qualidade de uma carga de chocolate oriunda da União Europeia. Valdir e Camila vestem grossos casacos, protetores de cabelo e propés e entram dentro de um terminal refrigerado. Ali, acompanham a abertura de um contêiner e a retirada de algumas das milhares de caixas de chocolate que ele transporta. Depois, com auxílio de documentos fornecidos pelo despachante, entregam-se à conferência, unidade por unidade, de informações como número de lote, nome do fabricante e prazo de validade dos produtos. A tarefa é desgastante, o ambiente é barulhento, empilhadeiras transitam num vai e vem frenético. O farmacêutico responsável pelo terminal, despachantes e proprietários da carga estão por perto, tensos e preocupados. Os fiscais têm de ter paciência e concentração. Ao final da minuciosa conferência das amostras, liberam a carga. Tudo certo com os chocolates europeus.
Alguns números de 2019
– 67 inspeções de carga.
– 2.732 emissões remotas de¿Certificado de Livre Prática.
– 50 emissões de Certificado de Livre Prática a Bordo.
– 234 emissões de Certificado Sanitário de Bordo.
– 18 inspeções de infraestrutura.
– 17 análises de mercadorias abandonadas e apreendidas.
– 3 acompanhamentos de destruição de drogas.
– 25 Autorizações de Funcionamento (AFE).